A polêmica ganha o campo religioso. Desde a primeira constituição da república existe a separação entre a Igreja e o Estado. O Brasil é um país laico. Não tem religião oficial como na época do Império, quando o imperador exercia alguma influência na religião oficial que era o catolicismo. Ninguém desconhece que a maioria da população professa a fé católica, mas os evangélicos começam a se organizar para ter uma representação no poder federal. E o caminho para isso é a política. Para tanto é preciso formar um grupo de pressão que influencie nas decisões do governo, participe das decisões mais importantes e, de fato, consolide a liberdade de escolha religiosa. Nem todos concordam com isso. O debate ganha espaço na imprensa e formam-se grupos de um lado e do outro. Por que não abrir para os pastores as mesmas possibilidades que usufruem o clero católico? Afinal, desde a proclamação da independência padre e bispos atuam abertamente e ocupam cargos eletivos como deputados e senadores. São atuantes na maçonaria.
A polêmica deveria se ater às constituições do Brasil. A carta de 1934 reafirma a liberdade religiosa e proíbe nas escolas o ensino de religião. Há quem diga que os católicos querem retomar a influência que perderam. Pela primeira vez surge um nome que é candidato da igreja evangélica, cuja base eleitoral são os protestantes. O candidato deixa bem claro que vai defender os interesses dos crentes do Brasil, considerados, até então, como uma minoria. A nova constituição autoriza o ensino religioso nas escolas públicas, mas ninguém é obrigado a assistir às aulas. É uma forma de oprimir a consciência das crianças, diz o pastor na Assembleia Nacional Constituinte. Depois de muitas idas e vindas fica registrado que” nós os representantes do povo brasileiro, pondo a confiança em Deus, reunidos em Assembléia Nacional Constituintes para organizar um regime democrático, que assegure à nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bem estar social e econômico.”
O candidato tem um sólido currículo. Vem das camadas médias da população, é mestre em Ciências da Religião e doutor em Educação. É o primeiro nome evangélico a figurar no cenário político. O que mais chama a atenção é que ele é pastor da igreja presbiteriana. Ele tem posições avançadas como o apoio do direito do divórcio e que o nome de Deus não deveria estar na constituição. Ninguém sonha que um ministro terrivelmente evangélico possa chegar ao Supremo Tribunal Federal. O pastor Guaracy Silveira é eleito constituinte, uma posição nunca antes conquistada por um evangélico. É verdade que era o único crente em uma reunião esmagadora de católicos. Seus discursos bem fundamentados, sua maneira pausada de falar na tribuna impressiona a todos. Parece que está em um culto religioso. Além disso, é um aliado dos partidos que defendem os operários e uma melhor distribuição de renda no país. Tudo foi por água abaixo 3 anos depois quando Vargas deu um golpe de Estado e implantou a ditadura do Estado Novo. Nova constituinte só em 1946 e lá estava novamente o incansável deputado Guaracy Silveira para defender os mesmos pontos programáticos que havia defendido na constituinte anterior.