O aperto de mão no aeroporto já se tornou praxe. Sempre que o presidente viaja para o exterior o vice assume a chefia do Poder Executivo. É uma oportunidade de estar em toda a mídia nacional e sorrir para a foto que, um dia, pode ir para a galeria do Palácio do Planalto, entre aqueles que por anos, ou por dias, ou ainda por algumas horas, sentaram-se na cadeira presidencial. Há divergência se o titular pode governar mesmo fora do Brasil – afinal, com a comunicação digital poderia acompanhar, ao vivo, 24 horas, o que se passa no país. Ainda assim, vice-presidente, ou o presidente da Câmara dos Deputados, ou do Senado, ou mesmo do Supremo Tribunal Federal, formam uma linha sucessória. Ficar vazia a cadeira não fica. Isso dá trela para que nos bastidores do poder se fiscalizem oposição e situação. Um de olho nos desejos do vice de assumir definitivamente o cargo, outro em zelar para que nada mude no governo e que o titular assuma tranquilamente quando retornar da viagem. Com direito a um novo aperto de mão de boas-vindas de quem ocupou interinamente o cargo.
O presidente americano viaja e ninguém assume o lugar dele. Mesmo em época onde a comunicação se fazia principalmente via telégrafo, ninguém imaginaria outro que não fora eleito para o cargo assumir a presidência. Nem mesmo quando da Conferência de Versalhes, depois da Primeira Guerra mundial. O presidente Woodrow Wilson ficou fora do país durante meses e, na falta do conhecido Air Force One, o gabinete presidencial se instalou a bordo de um navio estacionado na Europa. “Isso não se aplica ao Brasil”, vociferam os políticos que compõem a base política do governo no Congresso Nacional. É uma oportunidade para ter alguém de algum estado da federação na presidência da República. Um momento solene, com cobertura da mídia local, quando o ocupante assina alguns documentos, já agendados com o titular do cargo, e assim tem fotos e vídeos percorrendo todos os canais na internet. E certamente se torna personagem das reportagens principais do noticioso A Voz do Brasil. Para muitos é o auge da carreira.
Desta vez quem está no aeroporto para cumprimentar o presidente da República é o presidente da Câmara dos Deputados. José Sarney parte para Tóquio e o deputado cearense, Paes de Andrade, assume interinamente a presidência. Seus correligionários preparam festas e organizam uma viagem presidencial para Fortaleza. Às pressas preparam o avião presidencial, e uma lista de convidados eminentes, deputados, senadores, jornalistas e puxa-sacos de toda ordem. Afinal, é um voo de apenas algumas horas e ninguém vai se incomodar em ficar espremido entre tantas excelências. O que vale mesmo é estar, ao vivo, no aeroporto à hora em que o presidente interino da República desembarcar e for recepcionado pela elite política e econômica do estado, com direito a um cortejo rumo ao palácio do governo do estado. O roteiro de Paes de Andrade no Ceará pressupõe uma parada na sua cidade natal, Mombaça. E é para lá que se encaminha com toda a comitiva. A cidade se engalana, ruas são limpas, pátios e postes pintados, moradores a postos para assistir ao desfile presidencial em direção à igreja matriz de Nossa Senhora da Glória. O ponto alto da permanência do filho ilustre é a inauguração de uma agência do Banco do Brasil, sob discursos de agradecimento e visões de um futuro com financiamento para o progresso. A mídia do sudeste, invejosa, não perdoa Paes de Andrade e o apelida de o Imperador de Mombaça.