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Coluna do Heródoto

Urna devassável

By 17 de novembro de 2020No Comments

A urna é a principal suspeita. Os perdedores encontram um culpado pela derrota sofrida na eleição. Há fraude, proclamam. Atestam que a urna eleitoral não é indevassável e por isso os manipuladores podem impor o resultado das eleições e manter os grupos oligárquico no poder. Outra evidência é a lentidão com que os resultados são divulgados, prova que os votos são contados e recontados até que apareça o resultado que lhes interessa. Afinal é preciso justificar toda a dinheirama investida no pleito e o que os investidores esperam é a vitória de seus aliados. Por outro lado os que tiveram seus nomes divulgados como os primeiros vencedores resistem e devolvem a acusação de fraudadores para os que duvidam da idoneidade do processo eleitoral e das urnas. Isto esconde a disputa pelo poder no Brasil, que tem como base o domínio do poder local. Ele é a base da pirâmide que passa pelo controle dos estados e culmina com a posse do poder federal, que mesmo com a garantia da constituição da autonomia dos estados, acumula um grande poder. Tudo passa pelas mãos do presidente da república.

Não há divergência sobre o tipo de cédula que se deve adotar para a escolha dos prefeitos, governadores e presidente. O voto de papel é confiável. É uma cédula física, onde aparece o nome por inteiro do candidato, do seu partido político e se houver qualquer fraude é facilmente identificável. Caso haja divergência na contagem dos votos, é possível uma rápida recontagem, para isso as cédulas usadas na eleição devem ser guardadas durante um tempo e só depois de passado o prazo de recurso serem destruídas. Assim, dizem os arautos do sistema eleitoral vigente, preserva-se a lisura do pleito, o direito do eleitor ter a sua escolha política preservada. Isto é a base da democracia republicana. O que está por trás de tudo isso é um sistema que tem como meta manter o poder nas mãos de poucos. Aparentemente se submetem à vontade popular, mas a realidade é que encenam uma falsa democracia para que tudo mude e fique tudo como está. É uma farsa política. Através dela há o domínio do Estado em seus diversos patamares e a utilização do seu potencial para benefício de poucos, das oligarquias estaduais. É uma das explicações porque os partidos não se batem por mudanças reais, está bom do jeito que está. Eles são organizações de cunho local e regional e não tem programa, ideologia nem compromisso a não ser com a demagogia, divulgada durante as campanha eleitorais.

A política está restrita a cada quatro anos, tempo do mandato dos eleitos. Depois disso desaparece das ruas e se fecha nos conchavos dos grupos dominantes, nos almoços e jantares para poucos e nas reuniões regadas com bebida importada, onde decidem o que fazer com o país. Daí a importância da eleição, urna, campanha eleitoral e principalmente garantir a vitória dos aliados a qualquer custo. Mesmo que tenham que fraudar o processo eleitoral. A mecânica é simples, o chefe local se incumbe de dar suporte para instalação dos locais de votação, seus jagunços “garantem a ordem”, providenciam o transporte dos eleitores até o local onde podem exercer o direito de escolha. Desde que seja do indicado do oligarca. O dia da eleição é uma festa cívica. Troca de favores, pedidos atendidos e por atender, direito a ser recebido pelo coronel com sorriso, pinga, churrasco, beijinho nas crianças e promessas de atendimento de pedidos. Se possível um cargo no funcionalismo público para o filho mais velho. Só homens alfabetizados votam. Têm que escrever o nome do candidato oficial, se tiver dificuldade tem a ajuda de um servidor do coronel que segura sua mão para que assine o seu nome no registro de presença. Por isso a eleição é chamada de “bico de pena”, a caneta azul da República Velha. Tudo a descoberto, transparente, visível, democrático e sem fraude na contagem dos votos, uma vez que são contados antes mesmo de serem depositados na urna. O sistema sobreviveu até o movimento de 1930.