O que mais os políticos desejam é subir a rampa do Palácio do Planalto, a sede do Poder Executivo da República Federativa do Brasil. O espetáculo para a troca de poder é coberta pela mídia nacional, com uma multidão contida do outro lado da avenida por um cordão de isolamento bem policiado. Afinal, o percurso até ali é longo e cheio de armadilhas. A população ainda não se acostumou com uma escolha do presidente por meio de um processo eleitoral que pode desaguar em um segundo turno. Para levar logo na primeira rodada, estabelece a Constituição de 1988, é preciso obter a metade mais um dos votos válidos. Com uma pluralidade de candidatos, a tarefa é ainda mais difícil. É comum que os adversários do primeiro turno se tornem aliados no segundo, com acordos urdidos nos bastidores, longe dos eleitores e dos jornalistas. Para isso há todo um ensaio de declarações que nada dizem, nada explicam, mas – como diz um veterano comentarista – é o que temos para hoje. E a maior parte da mídia se contenta com isso. O público acompanha abestalhado as tramas que não entende.
A surpresa da eleição é a polarização entre dois candidatos. A campanha obrigatória, mas não gratuita, no rádio e na tevê pouco mostra de duas visões de mundo antagônicas. O centro da propaganda é atacar o adversário com um levantamento bem-feito de sua vida pregressa, com grande ênfase sobre o que pode abalar o eleitor e fazer com que ele escolha o outro contendor. É um verdadeiro vale-tudo uma vez que suspeitas se tornam fatos concretos, narrativas substituem investigações, depoimentos de aliados reforçam a narrativa. Inimigos são encontrados para ajudar a atingir a imagem do pretendente à presidência da República. Veículos de comunicação, especialmente redes de televisão, são apontados como sustentáculos deste ou daquele candidato. Slogans são cantados em concentrações políticas e nas regiões centrais da cidade. Faz parte da democracia, garantem os analistas políticos. Pior quando o eleitor não tinha o direito de escolher o candidato que mais lhe encantasse. Uma conquista da sociedade brasileira que viveu mais de 500 anos sob o regime autoritário colonial, imperial e oligárquico. Agora as coisas mudaram, tem até segundo turno para os cargos majoritários de presidente e governador.
O plano de governo dos pretendentes ao Palácio do Planalto se torna apenas um detalhe na cabeça do marqueteiro de plantão. Este assume uma importância que nunca teve, uma vez que é quem dá o norte das mensagens veiculadas pelos finalistas. “Caçador de Marajá” é o qualificativo do ex-governador de Alagoas, apoiado pela direita, Fernando Collor de Mello. “Líder metalúrgico” cabe ao candidato do PT, Luis Inácio da Silva, apoiado pela esquerda. Fora da competição ficam políticos tradicionais como Leonel Brizola, do PDT. É a primeira vez após o regime militar de 1964 que o povo elege diretamente o presidente da República. Há uma polarização que lembra a disputa entre Vargas e Eduardo Gomes em 1950. Mas desta vez pesa quem sabe usar como ninguém a força do marketing e da televisão para fazer uma campanha vitoriosa. O segundo debate entre Lula e Collor divide os analistas, que apontam vitoriosos diferentes. Mas a polêmica ganha maior intensidade no dia seguinte. A TV Globo é acusada de fazer uma edição dos melhores momentos de Collor e os piores de Lula e apresentar em dois telejornais no sábado anterior ao pleito. A questão foi parar na Justiça, mas o recurso foi negado. Collor, o Caçador de Marajás, vence e assume a presidência, cujo período se prolonga até o processo de impeachment na Câmara dos Deputados. Assume o vice Itamar Franco.