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Coluna do Heródoto

Parem as máquinas!

By 14 de julho de 2020No Comments

Foi ele condenado uma centena de vezes pela imprensa cuja irresponsabilidade e venalidade auxiliam a envenenar a sociedade a ponto de não mais curá-la. O clima político do país marcha para um radicalismo acentuado e os extremos políticos se acusam mutuamente pelos problemas nacionais, entre eles a profunda crise econômica vivida pelo país. Ninguém quer assumir a derrota sofrida e para tanto é necessário encontrar um bode expiatório para o fracasso dos militares. O governo se defende e usa e abusa da imprensa e da parcialidade dos jornalistas para acusar antecipadamente o condenado e até mesmo um ministro declarou em mais de uma entrevista que não havia dúvida que a nação sofrera uma traição. Ele mesmo não tinha dúvidas sobre a culpabilidade do traidor. Poucos se colocaram ao lado do acusado. A opinião pública também está convencida que ele precisa ser punido e responsabilizado pelo fundo do poço que vivia.

Uma verdadeira guerra se trava na imprensa. As denúncias se acumulam e contaminam os partidos políticos. Os debates na câmara dos deputados e no senado são cada vez mais acirrados e muitos acreditam que o pais está à beira de uma guerra civil. A impressão que outros países tem dessa situação é que os valares morais e éticos mais antigos e universais são excluídos do direito. Como uma pessoa pode ser condenada a priori, sem processo, sem uma decisão independente dos juízes? Afinal o processo deve tramitar na esfera da justiça militar ou civil? É mais uma polêmica que transborda dos jornais e é debatida nas ruas, nas feiras, nos mercados e em todos os locais onde se debate por que a sociedade chegou onde chegou. Afinal os códigos mudaram, ou os conceitos que devem prevalecer, uma vez que simplesmente a verdade é apenas verdade e a justiça apenas justiça, independentemente onde possa chegar ? As consequências precisam ser suportadas sejam ela quais forem.

O capitão é execrado e lançado a fúria dos radicais. Não tem esperança de escapar da pena máxima, ainda que a única prova que brandem contra ele é um relatório que supostamente teria sido escrito por ele e entregue aos inimigos. Isto afirmam os acusadores, foi responsável pela derrota humilhante que a França sofreu diante da Prússia. O império cai, uma república, a terceira da história nacional, é erguida às pressas para tentar governar uma sociedade humilhada e sem rumo. Ninguém esperava que o conflito pudesse terminar da forma desastrosa que terminou. Do outro lado proporciona a formação de um rival poderoso no norte da Europa, a Alemanha do chanceler Bismarck. O simulacro de julgamento termina com júbilo. No dia 22 de dezembro de 1894, o capitão do exército Alfred Dreyfus, de trinta anos, é considerado culpado pela corte marcial por ter entregue documentos secretos para uma potência estrangeira. É condenado à prisão perpétua na inóspita Ilha do Diabo, na América do Sul. Líderes políticos queriam que fosse fuzilado. Começa o Caso Dreyfus, que vai ocupar a imprensa pelo menos por mais dez anos. Até a descoberta da verdade. Ele era inocente.